Gerações se encontram e celebram o poder de contar a própria vida
Crianças e idosos lançam livros de diferentes temáticas e mostram a força plural da literatura no evento
Kamylla Lima – jornalista / Adriano Arantos e Renner Boldrino – fotógrafos
O ano era 1945 e o Brasil enfrentava uma turbulência com o fim do Estado Novo e o início da redemocratização. Setenta e um anos depois, em 2016, o país vivia outro momento histórico: o Rio de Janeiro fervia como sede dos Jogos Olímpicos, a primeira cidade da América do Sul a receber a competição. É nessa disparidade de contextos que nasceram Uyara Naglis, de 80 anos, e Kevin Messias, de 9. Vindos de épocas diferentes do mesmo Brasil, eles se encontraram na 11ª Bienal Internacional do Livro de Alagoas — cada um lançando seus livros, vivendo fases distintas e fortalecendo a literatura.
Uyara passou parte da infância em Maceió, brincando na famosa Praça Centenário. Já Kevin mora na cidade que os moradores orgulhosamente chamam de “Metrópole do Futuro”, Arapiraca. A capital e o Agreste alagoano, cada um com suas particularidades, marcaram os autores. Uyara — que significa Mãe-d’água na etnia Tupy — sopra para o mundo, por meio da autobiografia, a sua própria história. E foi aqui, na Praça de Autógrafos Dandara da Bienal, vestida como uma realeza, que ela mostrou aos visitantes a força de narrar a própria trajetória: do trabalho social nas favelas do Rio de Janeiro ao canto lírico e ao tempo em que viveu na Suíça.
Enquanto Uyara se volta para o passado, Kevin escreve sobre o presente. O menino buscou na amizade a oportunidade de eternizar momentos ternos da infância. Uma tarde regada a brincadeiras rendeu um livro com mais dois amigos: Antônio do Vale França e Pedro José da Costa Barbosa. O convite para escrever partiu do próprio Kevin, que, mesmo com TDAH, já chega ao seu quarto título. Desta vez, o tema é o amor-amigo — aquele que só a infância sabe traduzir com tanta pureza. Eles jogaram videogame, desenharam, pintaram e escreveram. O lançamento aconteceu pela Editora Performance, da mãe dele, a escritora Carla Emanuelle, que este ano voa solo na Bienal com nada menos que 110 títulos.
Na potente cumplicidade nascida da amizade de colegas de escola e na inspiradora história de uma mulher que desbravou o mundo e transitou por diversas manifestações de arte, as gerações se encontram na Bienal. O maior evento cultural e literário de Alagoas é, também, um espaço para contar e compartilhar histórias. Sejam as que estão apenas começando, como a de Kevin, ou as que já estão consolidadas, a exemplo da de Uyara.
“A gente passou a tarde toda brincando, jogando e desenhando. Eu gostei mais de desenhar o dragão de três cabeças. Depois, minha mãe ajudou a escrever. Ela digitou e eu fui dizendo as ideias. Foi muito legal ver tudo virando um livro”, contou Kevin, sorridente, exibindo o exemplar recém-lançado.
Para a mãe, a escritora e editora Carla Emanuelle, ver o filho seguir esse caminho é uma vitória que ultrapassa a literatura: “O Kevin tem TDAH e uma leve dislexia, então cada livro é uma superação. Ele sempre foi criativo, gosta de desenhar, inventar histórias, e encontrou na escrita um jeito de se expressar e vencer as dificuldades. A literatura virou uma aliada no desenvolvimento dele — e, pra gente, como família, é emocionante ver esse progresso”, contou, orgulhosa.
Já Uyara Naglis celebrou o reencontro com suas origens e o retorno a Alagoas para lançar o livro que narra a própria vida. “Eu escrevi poesias, mas entendi que precisava contar minha história. Saí de Alagoas com dez anos, vivi em São Paulo, no Rio [de Janeiro], e trabalhei com crianças em situação de vulnerabilidade. Subi morros, formei corais, cantei, eduquei, e quis mostrar que sempre há outros caminhos. Voltar aqui com meu livro é mostrar que nunca deixei de ser alagoana e que a arte pode atravessar gerações”, concluiu.
Sobre a Bienal
A 11ª Bienal Internacional do Livro de Alagoas é realizada pela Universidade Federal de Alagoas e pelo governo de Alagoas, com correalização da Fundação Universitária de Desenvolvimento de Extensão e Pesquisa (Fundepes) e patrocínio do Senac e do Sebrae Alagoas.
Sob a curadoria do professor Eraldo Ferraz, diretor da Edufal, o maior evento cultural e literário do estado também tem como parceiros a plataforma de eventos Doity, a rede de Hotéis Ponta Verde, o Sesc, a Prefeitura de Maceió por meio da Secretaria Municipal de Educação (Semed) e o Instituto Federal de Alagoas (Ifal), além das secretarias de Estado da Cultura e Economia Criativa (Secult), de Turismo (Setur) e de Comunicação (Secom) de Alagoas.
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